Kianda

sábado, março 03, 2007

Esfíncter

Dera para gostar de palavras. "Esfíncter", a preferida. Sentido desinteressado, mas, de qualquer forma, atrelado. As pernas roxas e o gosto amargo na boca. Boca que beijava às escuras um indelével sapo. Sapo que era sapo mesmo. A transformação imposta às vértebras e o valor posto à mostra.
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Adquirira, há pouco tempo, o hábito de ouvir música erudita. Não conhecia quase nada, ainda nos primeiros passos. Mas se encantara com Offenbach e já o considerava, de boca cheia, o seu compositor predileto.

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Procurava uma epifania, qualquer coisa que lhe mudasse o destino: "Eu me sento porque meus joelhos dobram e porque tenho nádegas. Se não tivesse nádegas e joelhos, não sentaria."

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Maravilhava-se toda, como não havia percebido antes?
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Lentamente, porém, a euforia ia passando e o tédio a dominava...

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A noite fresca, a janela aberta e a cortina de renda em livres vôos.

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Cheiros de hortelã atravessando a imaginação.

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Irritava-se.

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Era um cachorro guiado pela coleira.

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Érica Antunes
erica.antunes@gmail.com